Se ainda estivesse vivo, o cantor e compositor Raul Seixas (1945-1989) estaria completando neste 28 de junho 70 anos de idade e entrando assim numa etapa da vida em que já encontram – ou estão em vias de ingressar – vários contemporâneos seus, igualmente ídolos da música popular brasileira.
Como nos versos de um de seus primeiros sucessos, poderia continuar sendo “uma metamorfose ambulante”, sem ter “aquela velha opinião formada sobre tudo”. Ou então, contradizendo o que pregava para si mesmo na letra de outra canção, Ouro de Tolo, estar sentado “no trono de um apartamento, com a boca escancarada cheia de dentes, esperando a morte chegar”.
Morto prematuramente há quase 26 anos, Raul Seixas é um mito que permanece vivo e que a cada dia conquista novos fãs. É um ícone do rock brasileiro, que sucessivas gerações cultuam de forma espontânea, sem nenhuma estratégia de marketing neste sentido, como é comum nas últimas décadas com diversos ídolos do cenário pop mundial.
“Eu não tenho medo de morrer. Tenho medo de que me esqueçam”, disse Raul em uma das inúmeras fitas que deixou em seu famoso baú. Como acontece com muitos artistas, Raul Seixas tinha medo de ser esquecido e preocupado com a posteridade cultivava o curioso hábito de se autoentrevistar, gravando essas entrevistas em fitas de rolo ou cassete.
Hoje os escritos e depoimentos gravados do “maluco beleza” percorrem o Brasil na voz do ator Roberto Bontempo, que há 15 anos encena o espetáculo Raul fora da lei – a história de Raul Seixas. A peça é um musical diferente, em que não há o texto de um autor para contar a história do artista.
“Tudo o que eu falo na peça são escritos do próprio Raul. E acho que é por isso que o público se identifica demais com o espetáculo, o que explica a longevidade dele”, comenta Bontempo, que nos últimos dias 19 e 20 apresentou mais uma vez no Rio, no Teatro Rival, o musical, que tem direção de Luiz Arthur Nunes e José Joffily.
Fã de Raul desde jovem, o ator conta que a ideia de montar o espetáculo surgiu quando leu O Baú do Raul, livro que reúne os escritos dos diários do cantor. Organizado pela penúltima mulher de Raúl, Kika Seixas e pelo crítico musical Tárik de Souza, o livro foi lançado em 1992 e desde então já teve sucessivas edições.
“Resolvi fazer o espetáculo para botar o pensamento do Raul no palco. E aí entrei em contato com a família dele, com a filha, com a Kika Seixas, com a mãe do Raul, ainda viva na época. Fui me aproximando das pessoas que conviveram com o Raul. E a partir daí fiz o roteiro do espetáculo, juntamente com os diretores,” conta Bontempo.
Para o ator, Raul Seixas foi uma pessoa muito à frente de seu tempo e isso assegura a atualidade de seus escritos, de suas ideias – como a da Sociedade Alternativa - e de suas músicas. “É uma obra atemporal. O Raul falava do universo, do mundo, de uma forma muito ampla, abrangente, metafórica e isso acaba não envelhecendo. Pelo contrário, se torna eterno”, avalia.
Nascido em Salvador, no dia 28 de junho de 1945, Raul Seixas era um adolescente quando o rock surgiu no cenário musical dos anos 50 e chegou ao Brasil. Uma febre que contagiou jovens nordestinos em plena época em que o baião e seu criador, Luiz Gonzaga, predominavam nas rádios e nos bailes da região.
Fascinado pelo rock e pelo gestual de Elvis Presley, o adolescente Raul assistia a todas as sessões de um filme do cantor, Balada Sangrenta (1958), em cartaz na capital baiana naquela época. Em outro estado do Nordeste, um adolescente paraibano, dois anos mais novo que Raul, via o mesmo filme com idêntica fascinação.
Admirador de Raul, embora nunca tenha sido exatamente um fã dele, o cineasta Walter Carvalho – o adolescente paraibano que também curtia Elvis – veio a se tornar o diretor do documentário Raul, o início, o fim e o meio, filme biográfico sobre a obra do cantor e compositor, lançado em 2012. Convidado pela distribuidora Paramount, Carvalho, documentarista e diretor de fotografia consagrado, aceitou dirigir o filme.
Fonte: Exame