A Sociedade Civil Organizada de Petrópolis, representada pela Associação Amigos de Petrópolis (APANDE), o Instituto Civis e a AMA CENTRO HISTÓRICO, encaminhou uma carta aberta ao Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN), aos Conselheiros do Conselho Consultivo do Patrimônio Cultural e ao Ministério da Cultura pedindo que retirem de pauta, nesta terça-feira (25), a rerratificação, ou revisão, do tombamento do Conjunto Urbano Paisagístico de Petrópolis (RJ).
No documento enviado nessa segunda-feira (24), as associações afirmam que o projeto resultará no destombamento de cerca de 39% de área atualmente protegida pelo IPHAN há décadas. Sendo assim, solicitam que antes de apreciarem a retificação, o conselho promova ampla divulgação à sociedade civil; que os termos sejam colocados em Consulta Pública e que abra, democraticamente, espaço e tempo, para ouvir presencialmente representações da Sociedade Civil Organizada.
“O primeiro tombamento em Petrópolis - cidade lmperial brasileira por excelência - foi em 1961, há 64 anos. Posteriormente, houve novas proteções em 1980, 1981, e 1984, sempre com pareceres técnicos do IPHAN, ratificados, todos, pelo Conselhos Consultivos anteriores, e homologados pelos Ministros anteriores, sempre aumentando a proteção cultural na paisagem cultural e paisagística da cidade, de valor afetivo e histórico brasileiro incalculável”, apontam as associações.
O texto destaca ainda que a proteção mantida ao longo das décadas só foi possível graças à mobilização da população.
O projeto
Segundo o projeto, com as mudanças, a área tombada será ampliada em cinco vezes, com 50% da atual área do entorno incorporada à futura área tombada. No entanto, haverá redução considerável na extensão tomada de rios e córregos.
No Complexo Fabril de Cascatinha, haverá a ampliação da proteção de elementos que enriquecem a narrativa fabril do local. Estariam incluídos no tombamento a chaminé, pavilhões contíguos ao edifício fabril, a casa paroquial, a estação ferroviária, a usina, o embasamento da fábrica velha, três pórticos, duas pontes e os remanescentes de outra ponte;
Na Vila Operária da antiga Fábrica de Tecidos Cometa, atualmente apenas o trecho na Rua Padre Feijó é tombado. A proposta passa a incluir também o trecho da vila localizado na Rua Coronel Batista, estendendo a proteção ao conjunto completo;
Nos remanescentes da Fábrica Cometa no Meio da Serra, a proposta mantém os elementos tombados inalterados, mas promove uma redefinição significativa da área de entorno, com redução da abrangência. Essa diminuição se deu porque a antiga definição da área de entorno, baseada em um raio de 500 metros, gerava uma extensão muito ampla e sem referências claras no território, o que, segundo o IPHAN, dificultava a identificação de seus limites no local.
Quanto aos demais componentes isolados Casa Djanira, Casa da Ana Mayworn e Casa na Rua Cardoso Fontes , a proposta traz uma definição clara da área tombada e da área de entorno, que não estavam oficialmente delimitadas.
Para Myriam Born da AMA CENTRO HISTÓRICO, a cidade carece de um serviço eficiente para preservação ambiental.
“Eles alegam critérios técnicos de proteção a elementos representativos em áreas que deveriam ter sido protegidas pelo próprio IPHAN, mas foram degradadas por falta de iniciativa e competência do próprio IPHAN. Nas áreas que eles dizem mais afastadas onde passam os rios traçadas pelo Plano Koeler, que também se degradaram, eles alegam que podem ser liberadas. Entretanto, aí é que está o grande perigo, pois sem uma supervisão e sem a proteção legal, ficarão à própria sorte. Estamos cansados de ver a desordem em termos de construção com condomínios financiados ou não pelo governo. Isso abrirá o campo para uma selvageria como a que já assistimos acontecer, basta dirigir-se daqui do centro até Itaipava e ver o que de fato acontece. O que desejamos é um IPHAN que realmente proteja o patrimônio cultural que nos pertence, com um escritório técnico qualificado com profissionais experientes e uma estrutura capaz de dar conta da demanda de Petrópolis”, declara.
O presidente do Instituto Civis, Mauro Corrêa, teme a descaracterização de áreas tradicionais e o possível aumento da pressão urbana em áreas já saturadas.
“Nossa cidade tem história no Brasil e ela não está sendo preservada. Não se trata apenas de Museu Imperial e outros pontos turísticos, a história é um conjunto de coisas. Quando se começa a descaracterizar a cidade, a população é a primeira a perder qualidade de vida. Para gente, o principal risco dessa aprovação é a liberação de parte de Petrópolis para construção em lugares que já sofrem com trânsito intenso. Infelizmente, o projeto será assinado e não há o que fazer além de embarreirar na justiça futuramente”, comenta.
Posicionamentos
O Diário questionou o IPHAN sobre a demanda, que disse:
“O Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) esclarece que a proposta de rerratificação do tombamento do Conjunto Urbano Paisagístico de Petrópolis (RJ), que vem sendo debatida com a população da cidade em audiências públicas nos últimos meses, estabelece diretrizes mais claras e específicas sobre suas delimitações, promovendo uma abordagem integrada de preservação. A proposta amplia a área tombada no núcleo histórico da cidade em mais de cinco vezes, também incorpora toda a Vila Operária do Alto da Serra e passa a proteger novos elementos do complexo fabril de Cascatinha.
Também está prevista a manutenção da proteção de 40% das calhas de rios e córregos, sendo retirados da área tombada trechos de alguns rios, além de suas margens, mais distantes do centro da cidade. Parte dessas áreas excluídas já não apresentavam, desde o tombamento original, características compatíveis com o valor paisagístico, além de hoje estarem sob a responsabilidade de órgãos ambientais que não existiam na época.
Por outro lado, serão incluídas ao bem tombado encostas com Mata Atlântica, reforçando sua proteção paisagística e contribuindo para a prevenção de riscos, como deslizamentos. Essas áreas passam a contar com a atuação conjunta do Iphan, ICMBio e da prefeitura.
Pela proposta de rerratificação, o Iphan expandiria o território em que as intervenções devem preservar as características dos elementos protegidos, de modo a não comprometer o valor do bem, com a incorporação de praticamente metade do que hoje é considerado área de entorno.
Destaca-se que, por si só, o entorno não é uma área protegida. Nele, os imóveis podem ser modificados ou substituídos, desde que com autorização do Iphan e que tais alterações não afetem a ambiência e a visibilidade do conjunto tombado. Portanto, os imóveis localizados na atual área de entorno próxima aos trechos de rios a serem retirados do tombamento não teriam sua proteção cancelada, já que nunca estiveram tombados. Eles estão hoje sujeitos à avaliação de impacto sobre o bem tombado, mas não inseridos na área efetivamente protegida.
Assim, a apontada redução da chamada área sob tutela, que é a soma entre área tombada e área de entorno, não representa diminuição de preservação do bem tombado, visto que aquela que desfruta de proteção efetiva será muito maior”.
Já a Prefeitura de Petrópolis informou que:
“O Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN) é um órgão federal e que a alteração de entendimento sobre a área de tombamento decorre de demanda apresentada pelo Ministério Público Federal. Sempre que convidada a se manifestar ou a integrar etapas relacionadas aos estudos em andamento, a administração municipal esteve à disposição para colaborar. O governo municipal ressalta que confia na capacidade técnica do IPHAN e segue acompanhando o processo dentro das atribuições que lhe cabem”.






