Um dos maiores nomes da televisão brasileira faz aniversário neste sábado sem poder comparecer a um estúdio de gravação. Isolado desde o início da pandemia, Silvio Santos nunca ficou tanto tempo sem produzir um programa novo.
O Programa Silvio Santos não seria o mesmo sem a aglomeração das colegas de trabalho e os aviõezinhos de dinheiro voando pra lá e pra cá. Retomar as gravações semanais seria um alto risco, ainda mais para um senhor de 90 anos de idade.
A última vez que Silvio Santos colocou os pés no palco foi em dezembro do ano passado, antes de viajar para passar as férias na Flórida. Quando voltou, em março, a pandemia de coronavírus impediu qualquer chance de retorno e forçou o patrão a ficar isolado em casa.
Para o escritor Fernando Morgado, autor da biografia "Silvio Santos: a trajetória do mito", o apresentador está afastado da sua maior alegria:
"Eu pude testemunhar isso de uma maneira muito efetiva quando eu participei do programa dele, e eu pude ver o quanto ele gosta de fazer televisão, o quanto ele gosta de estar no palco, de estar com as colegas de trabalho. E realmente estar no palco para o Silvio Santos é quase uma terapia"
Outro biógrafo do apresentador, o jornalista Mauricio Stycer lembra que até o ano passado, com 88 anos, Silvio gravava religiosamente às terças, quintas e sábados, demonstrando sempre o mesmo prazer:
"Nunca quis parar de gravar. Fazia isso com muito prazer. Em 2019 eu participei da gravação do Troféu Imprensa e fique impressionado porque a gravação inteira dura cerca de quatro horas. O Silvio ficou em pé as quatro horas. Não parou, não se ausentou, não fez um intervalo. Aquilo ali era uma piscina pra ele."
Nem Silvio, nem sua esposa, Íris Abravanel, quiseram falar com a reportagem para contar como está a rotina em casa. Fontes próximas dizem que o empresário continua trabalhando do escritório, assistindo à emissora, dando orientações e fazendo mudanças na programação, algo que se tornou folclórico, a ponto da sigla SBT ter ganhado um significado alternativo: Silvio Brincando de Televisão.
Apesar de ter se tornado o maior símbolo da comunicação brasileira pela atuação na TV, Silvio começou no ramo como locutor, ainda na adolescência, ao ganhar um concurso de calouros na Rádio Guanabara. O emprego não durou muito porque o trabalho como camelô rendia mais.
Depois de servir o Exército como paraquedista, deixou as ruas e voltou para o rádio. Desde então, passou por várias emissoras. O último contrato foi na Rádio Nacional de São Paulo, já sob administração das Organizações Globo, onde permaneceu até 1976.
Em paralelo à função de locutor, Silvio também demonstrou desde cedo o tino para as vendas. Aos 18 anos, implantou um sistema de som na barca Rio-Niterói e passou a negociar anúncios publicitários.
Ao chegar a São Paulo, nos anos 50, foi trabalhar com Manuel de Nóbrega, que era dono do Baú da Felicidade. A empresa acabou nas mãos de Silvio. Para promover o Baú, em 1960, Silvio compra um horário aos domingos na TV Paulista, onde lança o programa "Vamos Brincar de Forca".
Em 63, estreia o Programa Silvio Santos, no ar até hoje, se tornando o show de auditório mais longevo do mundo. Desde então, o animador comandou mais de 120 formatos que se tornaram parte da cultura popular brasileira.
Na opinião do jornalista Mauricio Stycer, autor do livro "Topa tudo por dinheiro", uma das maiores qualidades do apresentador foi ter desenvolvido a capacidade de se comunicar com qualquer tipo de público:
"Programa de perguntas e respostas, ele fala assim: 'se eu faço uma pergunta e o espectador não sabe a resposta, não é legal. Se eu faço duas perguntas e o espectador não sabe a resposta, ele vai embora, não vai ficar no meu programa'. Então ele tinha uma compreensão racional de que ele precisava falar na mesma altura do público."
Ainda alugando horário da TV Globo, que adquiriu a TV Paulista em 1966, Silvio Santos tinha como principal objetivo ter o próprio canal de televisão.
Em 75, conseguiu a concessão da TVS do Rio de Janeiro. Em São Paulo, passou a transmitir pela TV Tupi. Em 77, comprou metade da TV Record e em 81 conseguiu a concessão do canal 4, abrindo caminho para a criação do SBT.
A exposição no ar permitiu não só a promoção pessoal, como das empresas do Grupo Silvio Santos, como lembra o escritor Fernando Morgado:
"O artista Silvio Santos continuará existindo enquanto for interessante ao empresário Silvio Santos. A existência do Programa Silvio Santos foi muito importante para que as empresas do grupo tivessem um espaço para se promoverem, e conseguirem clientes e evoluírem."
Atualmente o Grupo Silvio Santos tem 38 empresas, incluindo uma marca de cosméticos, um hotel e a Tele Sena.
Mesmo avesso a entrevistas, o animador nunca saiu dos holofotes: foi candidato à Presidência da República, sua família foi alvo de um sequestro que teve a negociação direta do governador de São Paulo, Geraldo Alckmin, se envolveu em um escândalo financeiro que culminou na perda do Banco Panamericano e mais recentemente tem visto as redes sociais repercutirem falas que antes não eram questionadas pela sociedade, mas que agora não são mais aceitas tão facilmente.
A unanimidade que permanece é que Silvio Santos faz parte da história brasileira, mesmo que isolado. E se do mundo não se leva nada, melhor que seja assim.
*Com a colaboração de Gabriel Damião