(Foto: Ralph Braz | Pense Diferente) |
Em tempos de pandemia, a busca por práticas esportivas ao ar livre tem despontado em Campos. Os destinos mais procurados são o Morro do Itaoca e a Lagoa Feia, evidenciados pelas postagens e compartilhamentos nas redes sociais. No entanto, a popularização desses espaços naturais gera uma sequência de desrespeito à natureza, seja por falta de conhecimento do usuário ou de informação pública.
Na Área de Proteção Ambiental (APA) Serra do Itaoca, conhecida como Morro do Itaoca ou Morro do Rato, que possui Mata Atlântica preservada, um tatu encontrado morto com perfurações de tiros, domingo (31), ilustra bem esse problema. Em contrapartida, o cenário de beleza natural atrai também olhares mais sensíveis e técnicos, como os de um grupo de cientistas da Universidade Estadual do Norte Fluminense (Uenf) que catalogou e estuda espécies raríssimas no local.
Mas os olhares atentos dos cientistas às riquezas naturais identificaram também ameaças à biodiversidade. “É grande a destruição da vegetação rupestre pela indústria de mineração de rochas, que é muito forte na localidade e é apontada como a maior ameaça global à biodiversidade dos afloramentos rochosos”, disse o biólogo pós-doutorando, Dayvid Couto.
O pesquisador, que é doutor em botânica pelo Museu Nacional do Rio de Janeiro, denuncia, também, a coleta indiscriminada de plantas, principalmente orquídeas, pelos turistas. “Esta prática configura uma das principais ameaças à biodiversidade do mundo. Por isso, é importante as pessoas compreenderem o papel dessas espécies no ambiente natural, pois cumprem suas funções ecológicas e são fundamentais para manter o ambiente em equilíbrio.
Além disso, identifiquei a presença de lixo nas trilhas, principalmente nas proximidades das antenas. O lixo das pessoas não cabe na beleza do Morro do Itaoca. Sejamos conscientes”, alerta Couto.
O turismo religioso também é forte na região. Fieis sobem o morro em busca de se conectarem com suas divindades, mas pelo caminho ficam objetos como fotografias e papeis com nomes de pessoas, alimentos como azeite e frutas para piquenique.Rotina no Itaoca
O gestor da APA, Igor Pinto, é credenciado pelo Instituto Estadual do Ambiente (Inea) e pontua outras irregularidades flagradas na serra. “Acontece aqui o que eu chamo de ‘egoturismo’, em que as pessoas estão mais interessadas em criar eventos para se enriquecer, mas desmerecem a parte ecológica, que deve vir em primeiro lugar. Observo que o descarte de lixo é feito em qualquer lugar, não há limitação no número de visitantes, animais silvestres são alimentados irregularmente. Muitos são capturados e vendidos ilegalmente. Os funcionários são assediados pelo comércio ilegal de animais silvestres. A área sofre ainda com o impacto ambiental deixado pela emissão de gás carbônico, fruto da circulação indiscriminada de veículos”, relata.
Apaixonado por natureza, o gestor afirma que adverte os frequentadores quanto à consciência ambiental, à observação de placas de sinalização e o cumprimento às diretrizes do parque, mas muitos visitantes não respeitam as regras. “Visitantes costumam usar drogas no local, riscam caules de árvores, aceleram motos liberando partículas poluentes. Falta muita consciência”, lamenta.
Ecoturismo e esporte
A Serra do Itaoca é conhecida nacionalmente por possuir a maior pista de downhill do Brasil. Além desta atividade esportiva, montain bike, trilhas e vôo livre também atraem visitantes ao local. No cume do morro existe uma rampa para vôos. Amantes da fotografia também costumam explorar o cume, registrando imagens marcantes que ganham o mundo inteiro pelas redes sociais da internet.
Espécies catalogadas da fauna e flora
Animais e plantas raros habitam a Serra do Itaoca, entre eles o gato-mourisco, conhecido também como jaguatirica preta, uma espécie endêmica da região. Além disso, foram catalogados lagartos, macaco Bugi, borboletas e pássaros.
Dayvid Couto cita a pequena e raríssima Bromélia encontrada no local, descrita na década de 90. “Até onde sabemos, ela existe apenas no Morro do Itaoca, o que a torna uma espécie é endêmica desta localidade.
Violência | Animais mortos pelo homem
Outro ponto relevante é a ocorrência de espécies ameaçadas de extinção presentes no local, como Hippeastrum striatum, Wunderlichia azulensis e Coleocephalocereus fluminensis, todas classificadas em uma das categorias de maior ameaça de extinção”.
Risco de extinção |Hippeastrum stritum
Segundo Dayvid, a presença de espécies ameaçadas, raras e endêmicas é reconhecida como um indicador prioritário para a criação de áreas protegidas em todo o mundo. “Então, devemos todos – pesquisadores, sociedade civil e poder público – zelar e agir para que este rico patrimônio ambiental não seja perdido para que as futuras gerações possam desfrutar das belezas e dos serviços ambientais prestados por essas espécies”, alerta.
Pesquisa Científica
A pesquisa do programa de pós-graduação em Ecologia e Recursos Naturais da Uenf avalia a composição de espécies em vegetação sobre rochas no Morro do Itaoca. “Encontramos 69 espécies de plantas, de 31 famílias botânicas, notavelmente Fabaceae (família do feijão), Cactos, Orquídeas e Bromélias. Vale destacar que 15 espécies registradas na área só podem ser encontradas sobre afloramentos rochosos na região sudeste do Brasil e três estão ameaçadas de extinção, de acordo com a lista nacional. Esses dados são importantes e servem de base para o poder público tomar decisões mais assertivas em relação as medidas de preservação. Para as populações que residem no entorno do Morro do Itaoca e os visitantes, vale uma reflexão sobre a importância e o privilégio de conviver com uma natureza tão exuberante, rara e ameaçada da Mata Atlântica”.
Origem
Conscientização ambiental | Visitantes são orientados a respeitarem a natureza
O nome Itaoca tem origem tupi e significa Casa de Pedra. A Serra do Itaoca é considerada um dos pontos mais altos de Campos, conhecido como a Planície Goytacá por causa da habitação de índios Goytacazes. A história retrata que durante o período de cheia que tornava a cidade alagadiça, os índios se refugiavam na Serra do Itaoca, que possui 417 metros de altura.
Fonte: Terceira Via