(Prefeitura de Campos - Foto: Ralph Braz | Pense Diferente) |
Mesmo longe do auge, a indústria petrolífera está dando uma guinada na exploração e produção de petróleo no pós-sal, com tendência a gerar aumento de recursos aos municípios produtores por meio dos royalties e participações especiais. Esta mudança no cenário – mesmo durante a pandemia do coronavírus – já terá reflexos no mês de agosto e deverá seguir até 2024, levando em consideração toda a instabilidade para o momento. A boa nova vem ancorada no que o secretário municipal de petróleo, Marcelo Neves, chama de tripé, que se baseia nas variantes da alta do dólar, do Brent (tipo de óleo explorado) e da produção que promete crescer em ritmo acelerado com a decisão da Organização dos Países Exportadores de Petróleo (Opep) em aumentar a produção mundial para equilíbrio do preço.
O cenário, apesar de instável, aponta para uma recuperação econômica na região. O preço do barril do petróleo, que antes – no início da pandemia – não chegava aos U$50, já está perto dos U$80. “O mercado ainda está muito inseguro por conta da variante Delta do coronavírus e o aumento da produção de petróleo que faz com os preços caiam. Essas medidas podem gerar uma oscilação em relação às projeções que a gente faz. Elas podem não se concretizar, mas posso afirmar que a tendência é de alta”, diz Marcelo Neves.
Soma-se ao tripé o lançamento do Programa de Revitalização e Incentivo à Produção de Campos Marítimos (Promar) do Governo Federal, que promete ampliar a vida útil de campos maduros de petróleo, como os da Bacia de Campos. “Este programa visa a revitalização dos campos marítimos. O Promar também deve reduzir progressivamente a alíquota de royalties pagas pelas petrolíferas sobre o que é produzido em excedente ao que se tem hoje e incentiva as empresas a investirem em tecnologia para a exploração dos campos maduros”, afirma Neves.
Muito óleo para jorrar
Ainda seguindo o secretário de Petróleo, a Bacia de Campos só explorou o equivalente a aproximadamente 35% de sua potencialidade. Os 65% restantes precisam de novas tecnologias para serem explorados. “É isso o que chamamos de campos maduros. Com a resolução da Agência Nacional do Petróleo (ANP) para redução das alíquotas dos royalties, as empresas petrolíferas poderão investir em novas tecnologias para exploração desse petróleo. O ministro de Minas e Energias deve vir à região nos próximos meses lançar o programa que deve favorecer estados, municípios e a própria União, garantindo uma sobrevida aos campos que pode chegar a 20 anos”, disse Neves, lembrando que o Promar já é realidade em campos petrolíferos da região Nordeste, por exemplo.
E dinheiro para circular
Para Marcelo Neves, há uma previsão de aumento escalonado para os municípios produtores receberem de royalties e participação especial a partir do mês de agosto. “Tudo dependerá do comportamento do mercado, mas a boa surpresa que talvez tenhamos no próximo mês é este aumento razoável da participação especial que os municípios recebem trimestralmente. Isto se deve ao lucro obtido pelos campos Roncador e Marlim da Bacia de Campos, que antes, em 2020, estavam com a receita negativa”, conta.
Aplicação de recursos
Especialistas defendem que estes recursos que chegam aos municípios como bônus – já que não eram esperados – sejam aplicados na população de forma urgente nos âmbitos social e de empregabilidade. É o que avalia o sociólogo José Luis Vianna, com um tom crítico. “A administração municipal está devendo há mais de 20 anos uma aplicação correta e justa destes royalties. Na fase da pandemia, o desemprego e a pobreza aumentaram e os benefícios sociais reduziram. Hoje, já temos o restaurante popular, mas é preciso recuperar algo equivalente ao cheque cidadão e à passagem social pelo menos para os mais carentes”, sugere Vianna.
O sociólogo acrescenta que o desemprego pode ser amenizado se o município cumprir decisão judicial de seis anos atrás que prevê a contratação de catadores da coleta seletiva dentro da política de resíduos sólidos. “Isso geraria empregos diretos, retiraria centenas de famílias da pobreza, não implicaria em altos custos para o município e ainda daria retorno à Prefeitura por causa do ICMS verde, além de proporcionar dignidade às famílias. Outra opção para aplicação deste novo recurso dos royalties é na Agricultura Familiar, que reduziria os custos da Prefeitura na compra de merenda escolar.
Emprego – Vianna lembra que uma forma rápida para geração de emprego durante crises é por meio de obras públicas. “Isto é o que mais emprega e ainda tem o benefício de concluir as obras que estão paradas ou dar início a outras”.
Visão do economista
O economista Ranulfo Vidigal destaca a aplicação destes recursos na infraestrutura física, econômica e social da cidade. “Com mais de 500 mil habitantes, a capital do açúcar possui um setor privado dinâmico, nos serviço tecnológicos, de saúde, de terceiro grau e pesquisa, mas precisa fortalecer sua vocação viária, com entroncamento estratégico da BR-101 e sua proximidade com o Sul do Estado do Espírito Santo”, afirma.
Para Vidigal, se houve desperdício na primeira onda de fartura, as lições e erros devem servir de rota para busca de acertos. “Com uma riqueza privada anual de R$16 bilhões, o poder público tem que investir cerca de R$ 200 milhões anuais para recuperar o tempo perdido. Dotando a cidade de infraestrutura capaz de gerar qualidade de vida e atrair novas indústrias”, sugere.
A Prefeitura de Campos não comentou sobre a aplicabilidade do recurso.
Construção Civil
Outro setor que opinou sobre a aplicabilidade dos recursos foi o da Construção Civil. “A Indústria e Construção tem sido uma das protagonistas na retomada de empregos da região, e prova disso são os dados da plataforma Retratos Regionais da Firjan: em todo o Norte Fluminense, tivemos um saldo positivo de 899 vagas abertas nos primeiros cinco meses deste ano. E com a recuperação dos royalties e a revitalização da Bacia de Campos, teremos mais dinheiro circulando na região, com possibilidade de movimentar toda a cadeia produtiva que gira em torno da Construção Civil e do mercado de petróleo e gás. Somada à tendência de aumento dos royalties ao avanço da vacinação, chegaremos ao fim do ano com esperanças renovadas para superarmos de vez a crise desencadeada pela pandemia”, destacou o presidente da Firjan Norte Fluminense e presidente do Sindicato da Construção Civil Norte Fluminense, Francisco Roberto de Siqueira.
Lei de partilha dos royalties
Enquanto o julgamento da partilha dos royalties, que pode resultar na divisão da riqueza para todos os municípios do país de igual forma, continua na gaveta do Supremo Tribunal Federal, os estados e cidades produtoras têm ainda mais o que comemorar. Não há previsão de quando a pauta será votada pela Corte.
O fim de uma era
Como tudo na vida tem início, meio e fim, a era da indústria do petróleo na Bacia de Campos está em seu último patamar, a três anos do fim de um ciclo que começou no ano 2000, teve seu apogeu em 2012 e chegou ao declínio a partir de 2015.
Segundo dados da Universidade Candido Mendes, a expectativa é de que Campos receba entre 2021 e 2024 o equivalente ao que arrecadou em 2003 e 2004 (R$ 475 e R$ 550 milhões) – época em que a exploração petrolífera na Bacia de Campos caminhava rumo ao apogeu. De 2014 para cá, no entanto, a indústria do petróleo começou o seu declínio.
Junto com o recurso dos royalties, foi avaliada uma série de indicadores sobre o desenvolvimento do Município. Os dados revelam que o número de emprego formal com carteira assinada cresceu entre os anos 2000 e 2019, assim como o índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb), no período de 2005 a 2017.
Outros pontos positivos: redução na taxa de mortalidade infantil e taxa de homicídios. No primeiro caso, a média de mortes de crianças com até um ano no ano 2000 era de 27,9 mortes para cada mil nascidas vivas e passou para 12,7 em 2018.
A taxa de homicídios também caiu de 42,5 para 39.1 entre os anos de 2007 e 2017. Já os investimentos públicos despencaram de 90 milhões no ano 2000 para 25,4 milhões em 2018, apesar de, neste período, a arrecadação passar de 158 milhões para 675 milhões, com destaque para o pico de arrecadação de 1,35 bilhão em 2012, quando o investimento não chegou nem a meio milhão.
Entre 2005 e 2020, o número de leitos disponíveis no SUS por mil habitantes caiu de 3,01 para 2.
Fonte: Terceira Via