O ministro Luiz Fux, do Supremo Tribunal Federal (STF), afirmou nesta quarta-feira (10) que não se configurou o crime de organização criminosa na denúncia apresentada contra Jair Bolsonaro (PL) e outros sete réus acusados de tentar um golpe de Estado em 2022. A decisão marca nova divergência expressiva no julgamento, que já havia contado com votos pela condenação integral dados por Alexandre de Moraes e Flávio Dino.
Segundo Fux, a Procuradoria-Geral da República (PGR) não demonstrou que os acusados formaram uma associação estável e permanente com uso de armas de fogo — condições necessárias para caracterizar organização criminosa. “A denúncia não narrou em qualquer trecho um horizonte de espaço temporal definido. Não narrou a permanência e estabilidade da organização”, disse o ministro, em tom crítico ao texto apresentado pela acusação.
A sessão foi interrompida no início da tarde por cerca de uma hora e retomada às 14h18.
Críticas à denúncia e à condução do caso
O magistrado destacou que o Ministério Público se limitou a mencionar suposta presença de caçadores, atiradores e colecionadores (CACs) em acampamentos de apoiadores de Bolsonaro, mas sem provas ou vínculo direto com os réus. “Estamos julgando os réus”, enfatizou.
Fux também questionou a forma como o caso vem sendo conduzido no Supremo e defendeu que o tribunal não deve atuar sob pressão política ou popular. “Não compete ao Supremo Tribunal Federal realizar um juízo político do que é bom ou ruim, conveniente ou inconveniente. Compete a este tribunal afirmar o que é constitucional ou inconstitucional, legal ou ilegal”, afirmou.
Divergências em relação a Moraes
O voto de Fux evidencia sua distância em relação à linha de Moraes, relator do processo. Desde o início da tramitação, o ministro tem se mostrado crítico à condução do caso pelo STF e chegou a defender que o julgamento fosse remetido à primeira instância. Em março, por exemplo, argumentou que atos preparatórios não poderiam ser tratados como crime consumado.
Mesmo descartando a acusação de organização criminosa, Fux ainda analisará os demais pontos da denúncia: tentativa de golpe de Estado, abolição violenta do Estado Democrático de Direito, dano qualificado ao patrimônio público e deterioração de patrimônio tombado. Ele adiantou que, em sua interpretação, o crime de golpe de Estado absorve o de abolição do Estado Democrático de Direito, por considerar que este é um meio para alcançar aquele.
Contexto do julgamento
O julgamento da chamada “trama golpista” chegou ao quarto dia nesta quarta-feira. Além de Bolsonaro, respondem no processo os ex-ministros Braga Netto, Anderson Torres, Augusto Heleno e Paulo Sérgio Nogueira, o ex-comandante da Marinha Almir Garnier, o ex-chefe da Abin Alexandre Ramagem e o ex-ajudante de ordens Mauro Cid.
Na véspera, Moraes e Dino votaram pela condenação dos oito acusados em todos os crimes apontados na denúncia. Dino, no entanto, sugeriu penas mais brandas a Heleno, Nogueira e Ramagem, por entender que tiveram participação secundária.
Com a manifestação de Fux, o processo se encaminha para a análise dos votos da ministra Cármen Lúcia e, por último, de Cristiano Zanin, que fechará a votação na Primeira Turma. O tribunal já está a um voto de formar maioria pela condenação de Bolsonaro por tentativa de golpe.